A fraude nominal

Rodrigo Peñaloza
3 min readJul 13, 2023

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(Rodrigo Peñaloza, 13/07/2023)

Warren Orbaugh nos relembra que um dos grandes instrumentos retóricos da esquerda (ou dos inimigos da Liberdade) é o anti-conceito, a deturpação do conceito para justificar pseudo-moralmente sua práxis revolucionária.

Um exemplo de anti-conceito é a ideia de “redistribuição de renda”. No cerne da filosofia marxista, a riqueza é um roubo e, pior!, é um roubo inerente ao modo de produção capitalista. Portanto, a ideia de roubo seria uma hipóstase da sociedade moderna. Isso, como todo economista sabe, é falso. É falso que a riqueza seja essencialmente um roubo e é um nonsense toda a análise marxista do valor, um nonsense há muito relegado aos capítulos dos livros de história do pensamento econômico. Na boca da esquerda, porém, a redistribuição de renda tem seu caráter de violação obscurecido pela aposição do pseudo-substrato de que a riqueza é um roubo, o que dá à ideia de redistribuição um ar de “justiça” que comove as massas.

Outro exemplo é a palavra “burguês”. Marx deturpou o conceito de “burguês” e o transformou no anti-conceito de que a esquerda se vale para inflamar as massas. Como anti-conceito, “burguês” é o explorador. Novamente o substrato é o de que a sociedade se divide entre exploradores e explorados. Entretanto, “burguês” significa o homem livre. Quando os gregos inventaram a πόλις, tinham em mente a ideia de uma sociedade de homens livres (os cidadãos) para viver a vida virtuosa. Os romanos traduziram o termo como civitas. O homem livre, no contexto da civitas, é o vir (de onde provém virtus, virtude), o civis. Quando o Apóstolo Paulo afirmou “Civis romanus sum!” (Sou cidadão romano!), era esse o conceito verdadeiro de “civis”, o de homem livre.

A civitas romana reflete a πόλις grega. O Burgo medieval reflete a Civitas. A sociedade livre moderna reflete o Burgo. Quando as cidades-estado se desenvolveram na baixa Idade Média e foram chamadas burgos, elas eram cidades nas quais comerciantes e artesãos conseguiam produzir riqueza e, assim, desligarem-se do domínio feudal ou monárquico. Se um servo fugia da tutela do senhor feudal e lograva esconder-se no burgo por um ano e um dia, a lei dizia que ele passava a ser burguês, ou seja, um homem livre, um cidadão, relembra-nos, mais uma vez, Warren Orbaugh (assista aqui à sua palestra: https://www.youtube.com/watch?v=hbi3a-7TAoE&list=PLF9aIFEJl1ROj1TnX0zQTWoYUkBbELut-&index=1&t=1800s). Burguês é o cidadão livre, é o responsável pelo sistema que deu origem à Revolução Industrial e à era de maior prosperidade que a Humanidade jamais viu, o único sistema que deu aos homens o benefício dos confortos da riqueza e da Liberdade como valor.

Marx inverteu o conceito. Ele forjou o substrato da exploração do trabalho. Com base nessa farsa, antepôs o explorador ao explorado e os identificou, respectivamente, ao burguês e ao proletário. O esdrúxulo desse malabarismo semântico é que o proletário também vive no Burgo, na Civitas, na πόλις!

Fraude nominal ou anti-conceito, segundo Warren Orbaugh, é uma palavra ou um termo que parece dizer uma coisa, mas que diz o oposto. Redistribuição parece dizer justiça, mas na verdade quer dizer expropriação. Burguês parece dizer explorador, mas na verdade significa homem livre.

Vemos a fraude nominal ganhar espaço em nossa cultura, como uma infecção que se espalha pelos órgãos vitais do corpo social da moderna πόλις, a sociedade livre. Do “politicamente correto” aos subterfúgios hermenêuticos de magistrados ativistas, da reflexão gramsciana sobre hegemonia e subalternidade à “democracia relativa” de um corrupto alçado subrepticiamente ao Poder, a fraude nominal vem destruindo as células sãs da Civilização, construída a duras penas não apenas pelo gênio de intelectuais que nos abriram o véu da Liberdade, muitas vezes com a própria vida, mas principalmente pelo gênio de inúmeros burgueses anônimos que, na busca pela Liberdade, nos legaram a Civilização Ocidental. Com o resto de liberdade de expressão que ainda temos em Terra Brasilis, o momento reclama reação contra essa horda de bárbaros que a querem destruir, fazer da πόλις ἄπολις. Por “bárbaros” quero dizer verdadeiramente οἱ βαρβαροί, que, por não falarem a língua da Liberdade, balbuciam suas fraudes nominais como gritos de guerra.

Πολίτης εἰμί. Civis sum. Sou um cidadão. Sou um homem livre!

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Rodrigo Peñaloza
Rodrigo Peñaloza

Written by Rodrigo Peñaloza

PhD in Economics from UCLA, MSc in Mathematics from IMPA, Professor of Economics at the University of Brasilia.

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