As Forças Armadas e o poder moderador
O papel das Forças Armadas como poder moderador na história do Brasil desde o Império é um fato histórico. Na verdade, a proximidade das Armas com a estabilidade gubernatória é uma herança portuguesa da dinastia de Avis.
João Camilo de Oliveira Torres, um dos maiores historiadores nacionais do século XX e uns dos poucos cuja pena não se deixou manchar pelo viés marxista, teve recentemente suas opera magna reeditadas pela Câmara dos Deputados. A coleção toda é um tesouro cultural. Contra João Camilo, obviamente, vão aqueles que, por razões de preferência ideológico-partidária, anseiam por expulsar de sua práxis qualquer possibilidade de reação vigorosa. A letra da Constituição sobre isso é, antes, o reflexo de uma tradição, não um mero acidente de percurso. Até mesmo o golpe da República, segundo João Camilo, é uma instância dessa tradição, já que Dom Pedro II perdera o poder de facto.
Na escola, no antigo segundo grau, meteram-nos goela abaixo a “História Econômica do Brasil” de Caio Prado Júnior, a qual éramos obrigados a dissecar com fichamentos semanais. Talvez os padres do Colégio Marista não se dessem conta da doutrinação sob seus narizes em pleno 1984, o fatídico ano de George Orwell. Na universidade, o mesmo método, só que com Celso Furtado. Nada, porém, de João Camilo de Oliveira Torres. E sobre a cultura nacional, nem mesmo Gilberto Freyre.
Este trecho, escrito há mais de meio século, elucida a importância do momento atual, especialmente o perigo alimentado por quantos não enxergam a gravidade da escolha que ora se nos apresenta, iludidos com picuinhas intelectuais superficiais, mas cegos à ameaça que paira sobre a estabilidade nacional. A esquerda — “esta” esquerda faminta do ouro pátrio e guiada pela boca de um corrupto mentiroso que há muito se perdeu em sua missão terrena -, esta esquerda não é uma escolha.
É desnecessário encarecer o papel político que as forças armadas têm representado na vida política brasileira. O que todavia parece que não foi devidamente fixado é a natureza deste papel. (…) Das teorias correntes a que mais se aproxima da verdade é ainda a que tem defendido ultimamente o professor Eugênio Gudin (…): as forças armadas são o Poder Moderador da República. Compete-lhes intervir quando um governo não consegue manter a ordem ou lança o país em rumos perigosos à segurança nacional. (…) Somente poderemos pensar sem riscos sérios em esperar o fim das intervenções militares na política se conseguirmos dotar o Estado de condições de neutralidade ideológica capazes de eliminar possibilidades de ser a máquina estatal colocada a serviço de partidos, de interesses políticos, principalmente antinacionais, e quando se garantir a segurança nacional de modo tranquilo e perfeito. (…) [U]ma coisa é evidente: as forças armadas consideram de seu dever intervir quando o dever exige. (…) O fato já visível no império (nos atritos entre Caxias e Zacarias) é simples e nítido como o fio de uma espada: enquanto os políticos civis se perdem em estéreis lutas de partido, que comprometem a unidade nacional, movidos, muitas vezes, por ambições desenfreadas, o soldado luta calado…
Fonte: Coleção “João Camilo de Oliveira Torres” (1973, edição de 2019), vol. 1: Interpretação da Realidade Brasileira, cap I, seção 3, ed. Câmara dos Deputados.
O aparelhamento do Estado é outro fato, o qual, aliás, presenciei a contento, sem mencionar a doutrinação marxista e partidária nas escolas e universidades. O que o Presidente Bolsonaro tem feito (com aquele chamamento a que as instituições joguem “dentro nas quatro linhas”, ou seja, sob os limites de suas funções genuinamente constitucionais), ainda que obstado pela irresponsabilidade da esquerda e principalmente pela vergonhosa militância de parte do Judiciário, é justamente “dotar o Estado de condições de neutralidade ideológica capazes de eliminar possibilidades de ser a máquina estatal colocada a serviço de partidos, de interesses políticos”, com o óbvio fim de estabilizar a República e — pasmem, ilustres! — banir quaisquer possibilidades de golpe militar. Ainda assim, o que incomoda os intelectuais de Terra Brasilis é a deselegância verbal do Presidente.
Não há como menosprezar a importância da obra de João Camilo de Oliveira Torres. Resta-nos aspirar que sua obra entre, finalmente, nas escolas e nas casas dos brasileiros. Se não quisermos sobressaltos políticos e institucionais, é preciso blindar o Estado de toda tentativa de aparelhamento partidário, enquanto ainda temos Liberdade.