Especulação e volatilidade de preços
Nos meios de comunicação e nas aulas do ensino médio de Terra Brasilis, o termo especulação é quase sempre apresentado como uma característica negativa da economia de livre mercado, uma palavra mais no arsenal retórico de fraudes nominais de terraplanistas.
O que diz, porém, a Teoria Econômica? Ora, vivemos em um mundo de incertezas e riscos. Nossos planejamentos de produção agrícola, por exemplo, sofrem, fatalmente, o impacto das adversidades da Natureza. Quando isso ocorre, a escassez e a heterogeneidade dos agentes se encarregam de variar os preços relativos em magnitudes além das esperadas. A isso chamamos volatilidade. O que a Teoria Econômica diz é que a especulação tem um importante papel na redução da volatilidade dos preços. A história de Milharino, um especulador, que conto em seguida esclarece o porquê.
Os deuses do Olimpo decidiram que daqui a seis meses haverá uma imensa seca que derrubará a safra de milho. A fome será grande. Para os mortais, a seca futura é apenas um evento pouco provável, pouco o bastante para não valer a pena pensar nela. Porém, existe um mortal chamado Milharino que pensa nessas coisas. Milharino é um especulador. Ele compra milho quando julga que o preço está baixo e vende quando julga que o preço está alto. Milharino é egoísta, porque ele quer lucrar. Maldito especulador! Milharino gosta de especular. Ele está especulando que haverá uma grande seca e vai faltar milho no mercado daqui a seis meses. Milharino, então, compra muito milho, muito, pra vender quando faltar milho e, assim, encher os bolsos. É tanto milho que Milharino compra, que o preço atual se eleva. O povo reduz o consumo de milho, trocando milho pelo consumo adicional de batata. O egoísmo de Milharino faz o povo economizar no consumo de milho. Seis meses depois, a seca chega e a fome também. Milharino teve sorte em sua aposta e agora ele joga de volta no mercado todo aquele milho que ele havia comprado, reduzindo o preço. Graças ao egoísmo econômico de Milharino ao especular, Milharino suavizou a trajetória dos preços do milho, reduzindo sua volatilidade. Um preço que era de $10 agora e seria $18 na seca muda para $12 agora e $15 na seca. Além disso, ele induziu uma economia de consumo na época das vacas gordas para, então, aliviar a fome na época de vacas magras. Ele fez exatamente o que o governo faria com um programa de estabilização de preços. Fez também o que José do Egito recomendaria ao faraó. Todos os dias, porém, ele lê nos jornais que Milharino é cruel, porque lucra com a seca. Mas isso só ocorre se Milharino acertar na loteria, ou seja, se sua conjectura de vacas magras realmente se concretizar. Se as pessoas fossem mais previdentes, economizariam hoje para aliviar a carência de milho na seca. Só que elas não são. Quem faz isso por elas é o Milharino e ele o faz em troca do lucro. Maldito Milharino! Se ele tivesse errado em suas expectativas, arcaria com seu prejuízo sozinho sem ninguém saber.
Esta é uma historieta que ilustra um fato estilizado na Teoria Econômica que vem desde Milton Friedman, William Baumol, Armen Alchian e outros. O artigo abaixo, um dentre muitos, apresenta uma evidência empírica.
Brunetti, Büyükşahin and Harris: "Speculators, Prices, and Market Volatility", The Journal of Financial and Quantitative Analysis, Vol. 51, No. 5 (OCTOBER 2016), pp. 1545-1574.
Dizem os autores:
"These results are important for both researchers and policymakers alike. For researchers, we demonstrate that the trades of speculators can reduce market volatility by taking positions opposite to commercial entities with hedging needs. (...) Our results should give pause to those who seek to limit speculative trading based on the observation that positions have been growing."
Bona sint tibi studia et vale quam optime.