Inflação, um fetiche neoclássico

Rodrigo Peñaloza
3 min readJan 16, 2025

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Luís Salas Rodríguez, sociólogo venezuelano e professor de Economia Política da Universidade Bolivariana da Venezuela, foi indicado por Nicolás Maduro, em 6 de janeiro de 2016, para ministro de Economia Produtiva e para o cargo de vice-presidente de Economia do governo venezuelano, o equivalente ao nosso ministro da fazenda. Não durou muito, mas isso não vem ao caso. Entre as honrarias acadêmicas que o nobilitaram para o cargo está o seu primeiro lugar no II Concurso Internacional de Trabalhos de Pesquisa sobre Economia Política e Direitos Humanos da Universidade Popular das Mães da Praça de Maio, Argentina, em 2010.

O que, porém, lhe valeu a indicação foi sua obra Escritos desde la Guerra Económica, de 2014, em que argumenta que a inflação é um fetiche neoliberal. Basicamente, a inflação é o resultado da luta de classes na sociedade capitalista, na qual os produtores, movidos pelo vício da ganância, simplesmente aumentam os preços o quanto querem. Como o trabalho não foi publicado numa revista acadêmica mainstream, infelizmente o autor não teve a oportunidade de explicar por que, se é assim, os empresários venezuelanos não ficam infinitamente ricos. Como afirma José Félix Rivas Alvarado na apresentação que faz da obra-prima de Salas, os economistas enredados nas tramas da ciência-ficção-neoclássica, ao se depararem com os instigantes questionamentos de Salas, escandalizar-se-ão e taparão os ouvidos quando Salas sentencie “A inflação não é um problema” e dirão que Salas é um herege. Com efeito:

"Estoy seguro, que cuando este libro caiga en manos de los economistas atrapados por la ciencia-ficción-neoclásica, muchos reaccionarán escandalizados, a partir de una interrogante disparada por el profesor Salas: ¿Es la inflación el principal problema de la economía venezolana? Se taparán los oídos cuando el Salas sentencie, “la inflación no es un problema”, y sentenciarán que este provocador es un hereje".

São 194 páginas que não li e nem recomendo, mas sei que no Brasil haverá quem tenha estômago forte para esse sacrifício em prol do conhecimento. Já vi professor dizer, aqui mesmo em Pindorama, que escassez é uma fantasia neoclássica. Riam… ou vomitem, conforme a saúde de cada um.

Agora entendo o contexto. A inflação venezuelana é uma mentira, ela não existe. Disse Santo Agostinho de Hippona, em seu DE MENDACIO (Da Mentira), 3.3:

"... pois nem todo mundo que diz uma coisa falsa mente, se ele realmente crê ou opina ser verdadeiro aquilo que ele diz. Porém, entre crer e opinar existe uma distância, a saber, que, às vezes, aquele que crê sente que ignora aquilo em que crê, embora não duvide absolutamente daquilo que ele reconhece ignorar, se sua crença é firme; aquele, porém, que opina, julga saber o que, na realidade, ele não sabe". (*)

Sinceramente não sei se Salas crê ou apenas opina. Parece-me que Salas é um caso de crédula opinião.

Enquanto isso, teorias erradas sobrevivem escudadas pela falsa ideia de que são apenas teorias alternativas, tão merecedoras de cadeiras em nossas universidades como as cadeiras de astrologia que qualquer estudante de Física é obrigado a tomar para receber seu diploma. Está mais do que na hora de rechaçar esses farsantes com a mesma veemência com que atacam seus espantalhos.

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(*) Non enim omnis qui falsum dicit mentitur, si credit aut opinatur verum esse quod dicit. Inter credere autem atque opinari hoc distat, quod aliquando ille qui credit, sentit se ignorare quod credit, quamvis de re quam se ignorare novit omnino non dubitet, si eam firmissime credit; qui autem opinatur, putat se scire quod nescit. - Augustinus Hipponae, DE MENDACIO, 3.3.

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Rodrigo Peñaloza
Rodrigo Peñaloza

Written by Rodrigo Peñaloza

PhD in Economics from UCLA, MSc in Mathematics from IMPA, Professor of Economics at the University of Brasilia.

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