Olá, Daniel. Obrigado pelas perguntas, todas interessantes. Não foi dito que a teoria não contradiz a realidade. O que é dito é que a teoria lida com um aspecto específico da realidade: a escassez. Se existe escassez, existe problema econômico, da mesma forma que, se existe vida, existe um problema biológico. Simples assim. Isso não torna a teoria trivial, tal como dizer que a Física lidar com conceitos como força não a torna trivial quando dois advogados discutem leis, algo que é real mas que não tem nada a ver com Física. Portanto, podem existir instâncias de abundância, só que então isso não será um problema econômico. Tampouco foi dito que a teoria só vale para bens. Mais uma vez: é a escassez. Não à toa se diz que a economia é a ciência da escassez. Não confunda escassez com a ideia de bens. Um bem é quando você quer mais de algo; escassez é quando, para ter esse algo mais, você tem sacrificar alguma outra coisa. A teoria comporta muito bem a ideia de “mal”. Por exemplo, externalidades negativas. Ninguém deseja poluição, mas uma firma pode desejar bens para transformá-los em outros bens e ainda assim produzir um mal. O que a teoria explica sobre isso é que a externalidade negativa ocorre porque a firma não internaliza todo o custo marginal social dos sacrifícios em que incorre para produzir. Como se vê, a explicação é em termos dos custos inerentes à escolha, os quais, se não forem internalizados, geram distorções. Em terceiro lugar, a teoria econômica não prescreve como deva ser o comportamento do consumidor. Ela não tem essa pretensão, pois isso seria ser uma ciência “normativa”, o que não é o caso: ela é positiva. Em outras palavras, se observamos um certo padrão de comportamento, temos um modelo que o descreve e, portanto, se nada mudar, as conclusões do modelo são bons preditores. Por fim, o argumento da “necessidade material” é incorreto. Os indivíduos podem ser movidos por necessidades materiais, mas isso não contradiz a escassez. Você pode ter uma necessidade mínima de alimentos no dia, mas pode desejar uma colher a mais de feijão em troca de um pouco menos de alface. Armen Alchian aborda esse argumento da necessidade logo no início de seu livro. Como sugestão, Ken Binmore, no livro “Rational Decisions”, trata de forma muito clara essa questão da positividade versus normatividade não só na Economia como também na Teoria dos Jogos.