Quem pagava a conta na URSS?

Rodrigo Peñaloza
2 min readFeb 22, 2024

Em 1948 a tonelada de centeio era vendida aos moleiros estatais por 338 rublos. A fazenda coletiva (Колхoз, o acrônimo de коллективное хозяйство), que produzia e vendia o centeio, recebia, no máximo, 8 rublos, basicamente o mesmo de 1928, quando Stalin roubou as terras dos camponeses para criar as fazendas coletivas. A maior parte da diferença entre os 338 rublos pagos pelo setor de moagem e os 8 rublos recebidos pelos produtores de centeio era um imposto sobre o volume de negócios (turnover tax). Como qualquer imposto, ele gera custos de eficiência (deadweight losses). Essas perdas sociais não aparecem nos benefícios e custos dos produtores de centeio e do setor de moagem, mas nos recursos sacrificados por essas duas pontas, a saber: o camponês que planta na fazenda e o consumidor urbano que compra o pão de centeio. Essas perdas sociais se compõem, de um lado, das perdas dos consumidores que reduzem o consumo de pão ou deixam de comprar por causa do preço mais alto, e, do outro, dos camponeses que recebem menos do que poderiam receber, se os preços sinalizassem a verdadeira escassez relativa de centeio. E para quem ainda não sabe, essas perdas já são líquidas da arrecadação tributária do estado. Esse é só mais um exemplo das perdas sociais em que os cidadãos soviéticos, em especial os consumidores urbanos e o camponeses pobres, eram obrigados a incorrer, mesmo que não se dessem conta.

Fontes:
(1) А. К. Сучков (1949): Государственные доходы СССР, Москва. Este é apenas um de uma série reeditada de anos em anos sobre as receitas tributárias soviéticas.
(2) A. Nove (1986): The Soviet Economic System, Unwin Hyman, 3rd ed., London. Este é um livro sobre como funcionava o sistema econômico soviético, desde Stalin até Brezhnev. Descreve as políticas de preço, a indústria, a agricultura, salários etc. Aliás, Alec Nove tem outros livros também muito bons sobre a economia soviética.

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Rodrigo Peñaloza

PhD in Economics from UCLA, MSc in Mathematics from IMPA, Professor of Economics at the University of Brasilia.