Rodrigo Peñaloza
3 min readDec 14, 2021

Uma visão econômica da Democracia

(Rodrigo Peñaloza)

Quando falamos de Democracia, temos sempre uma visão negativa, em geral expressa naquele famoso dictum de Churchill, segundo o qual a Democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras. Juntem-se a isso os inevitáveis problemas inerentes aos métodos de votação elucidados por Kenneth Arrow em seu Teorema de Impossibilidade. Em suma, essa visão enxerga o que é ruim nas formas de governo e trata a Democracia como aquela que, se fede, pelo menos não aumenta a caca.

Existe, entretanto, uma visão mais positiva e que expressa a Democracia como a única capaz de resolver certos problemas que as outras formas de governo definitivamente não conseguem resolver. O grande obstáculo a esse entendimento é que temos sido não só incapazes de perceber a Democracia como solução desses problemas, mas principalmente de identificar os problemas que ela de fato resolve.

Josiah Ober, em Democracy and Knowledge: Innovation and Learning in Classical Athens (Princeton University Press, 2008), com base numa série de evidências das cidades-estado gregas e ancorado na abordagem institucional da Teoria Econômica, na Teoria dos Incentivos e na Teoria da Ação Coletiva, sugere encarar a Democracia como a capacidade de um público de fazer coisas (mais que meramente votar), focar na relação entre inovação e aprendizado (não apenas em barganha e votação) e desenhar instituições que agreguem conhecimento útil. Em suma, a Democracia cria instituições que permitem o compartilhamento de conhecimento, resolução de informações assimétricas e incentivos para a cooperação.

Sua tese, na linha de John Adams e Friedrich Hayek, é que a Democracia resolve três problemas: ação coletiva, coordenação e recursos comuns.

O problema da ação coletiva é caracterizado como um Dilema dos Prisioneiros. A cooperação é Pareto-superior, mas não é equilíbrio de Nash do jogo estático. Neste ponto eu dou meu pitaco e lembro aos amigos que Henry Hazzlit, em Foundations of Morality, em muito antecipou a dinâmica temporal como solução para esse problema: é o que ele chamava de perspectiva de longo prazo. É porque pensamos no longo prazo que cooperamos. Na teoria dos Jogos, isso se reduz ao Dilema dos Prisioneiros infinitamente repetido, que, como sabemos, implementa a cooperação como equilíbrio perfeito de subjogo.

O problema da coordenação tem a ver com assimetrias informacionais: eu posso querer cooperar, mas não sei se você quer. Vejam que essa é uma questão epistêmica. Segundo Ober, a Democracia ateniense resolvia esses problemas pelo compartilhamento de conhecimento. Isso difere da Democracia moderna justamente porque nesta as decisões sociais são delegadas a especialistas. Neste ponto, pelo menos por enquanto, não seria tão simpático a essa crítica, mas aceito a visão mais ponderada de que, num certo sentido, "ouvir" o público seja informativo, desde que naquilo não-técnico. Por exemplo, detestaria ouvir economistas mal-formados sobre como conduzir a política econômica. No âmbito jurídico, o técnico é a letra da Lei. Eu diria, antes, que é o conjunto dos princípios fundamentais. A Liberdade é um desses princípios. Quanto mais a Hermenêutica estende os braços sob o comando de quantos violam os princípios fundamentais, tanto mais a Democracia é posta em risco. Há claramente um trade off entre a especialização do processo decisório e o compartilhamento do conhecimento. Isso não vem ao caso agora, mas penso ser a principal diferença entre o antigo e o moderno. A causa? O tamanho das nações. Não sem razão visões mais liberais defendem unidades nacionais pequenas.

Finalmente, o problema da propriedade comum ou a Tragédia dos Comuns. O sobreuso dos recursos ocorre em razão do mau desenho das instituições, que em seu mau-funcionamento desalinham a alocação dos custos e benefícios.

Não pretendo detalhar aqui os pormenores que você, leitor, descobrirá com a leitura do livro, apenas lhe dar uma antevisão da jornada. Boa leitura!

Rodrigo Peñaloza
Rodrigo Peñaloza

Written by Rodrigo Peñaloza

PhD in Economics from UCLA, MSc in Mathematics from IMPA, Professor of Economics at the University of Brasilia.

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