Vinum

Rodrigo Peñaloza
2 min readMay 16, 2023

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Há um bom tempo, num restaurante, vi um cara tomando vinho tinto. Fazia aquela pompa de quem já fez curso de sommelier (é assim que se escreve?). Debaixo do terno tinha até um colete! Analisar o vinho listando suas propriedades aromáticas, uva, safra e seja mais o que for é, para mim, como narrar a história da filosofia sem saber filosofar. É uma elegância aparente, uma elegância seca. Quando é que vão entender que a degustação do vinho não tem lógica, não é um ato racional? O vinho é uma bebida que tem semideus, Baco ou Dioniso, filho da mortal Sêmele com Zeus. Aliás, um semideus cuja principal característica é enlouquecer aquele que se esconde da própria sombra (digo sombra no sentido jungueano). Um semi-deus que nasceu da luz e da sombra, da luz de Zeus e da sombra de Perséfone por intermédio de Zagreu. Um ente de céu e inferno. Tomar um vinho tinto é uma experiência absolutamente pessoal. Essa experiência está no gole em si, mesmo que seja um só. É ser a vítima de uma tragédia grega, um sacrifício canibalístico-ritualístico, tal como nas Bacantes, de Eurípedes. O vinho não foi inventado, foi um presente divino aos homens. A elegância de degustar um vinho está em submeter-se ao seu significado psíquico: luz e sombra, animus e anima, Olimpo e Hades. Tive vontade de dizer, mas não disse: "se você quer entender de vinho, meu caro, esqueça tudo que estudou e solte essa gravata".

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Rodrigo Peñaloza
Rodrigo Peñaloza

Written by Rodrigo Peñaloza

PhD in Economics from UCLA, MSc in Mathematics from IMPA, Professor of Economics at the University of Brasilia.

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